terça-feira, dezembro 26, 2006

Descrição de uma cidade

Não há lado esquerdo na metafísica,
O que não é uma limitação.
A produção industrial de problemas
Solta para o ar nuvens espessas
Que interferem no aeródromo.
Aviões cobertos de graffiti não conseguem levantar voo
Porque, entre os vários desenhos, os miúdos
Desenharam pedras de granito. A Ideia de granito
Pesa mais que a existência concreta de um
Balão, o mundo das ideias é estado transitório entre
O Nada e a montanha. Entretanto, a
Natação tornou-se importante para a cidade
Depois do dilúvio ocorrido há três mil anos. O governo
oferece inscrições gratuitas e ainda casais de animais
Bruscos, mas mansos. Os homens andam felizes, e também
As mulheres, porque todos aprendem a nadar antes dos
Sessenta. Hoje, neste século, morre-se afogado mais tarde.
O mundo é perfeito de todos os lados,
Menos do lado onde estamos: como um sólido geométrico
Belo que cai na cabeça desprevenida.
O mundo é fantástico visto de cima, de helicóptero. A linguagem
Sobe e interfere em camadas específicas da atmosfera,
As palavras que usas não são inertes. O inglês por exemplo,
É Língua que entra excessivamente nas nuvens. O inglês
Para a Astronomia é deselegante, e prejudica ligeiramente
As aves baixas.
No outro lado do mundo, entretanto, alguém, de grandes dimensões
Enfia o aeródromo num saco de plástico. As pulsações
Da alma medem-se pelos pressentimentos, não por
Aparelhos medicinais. E não se ilumina a escuridão,
Ilumina-se algo que já não é escuridão; precisamente porque
A escuridão é escura, escuríssima segundo dizem.

Gonçalo M. Tavares

segunda-feira, dezembro 18, 2006

hampi - a cidade mais invisivel

colo com este livro

as cidades e os olhos. 3

Depois de ter caminhado sete dias através de bosques, quem vai para Bauci não consegue vê-la e no entanto já lá chegou. São as finíssimas andas que se elevam do solo a grande distância umas das outras e se perdem acima das nuvens que sustêm a cidade. Sobe-se com escadotes. No chão os habitantes raramente se mostram: têm já tudo de que precisam lá em cima e preferem não descer. Nada da cidade toca o solo à excepção daquelas pernas compridíssimas de fenicóptero em que assenta e, nos dias luminosos, uma sombra perfurada e angulosa que se desenha na folhagem.

Três hipóteses se põem sobre os habitantes de Bauci: que odeiam a Terra; que a respeitam a ponto de evitar qualquer contacto; que a amam tal como ela era antes deles e com binóculos e telescópios apontados para baixo não se cansam de passá-la em resenha, folha a folha, pedra a pedra, formiga por formiga, contemplando fascinados a sua própria ausência.
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Italo Calvino, As Cidades invisíveis

colo infinitamente com este livro (e com o dos proverbios qd estou mais cansada)


"- De agora em diante serei eu a descrever as cidades - disse Kublai Kan - Tu nas tuas viagens verificarás se existem.
Mas as cidades visitadas por Marco Polo eram sempre diferentes das pensadas pelo imperador.
- Contudo eu tinha construído na minha mente um modelo de cidade de que deveria deduzir-se todos os modelos de cidades possíveis - disse Kublai - Contém tudo o que corresponde à norma. Como as cidades que existem se afastam em grau diverso da norma, basta-me prever as excepções à norma e calcular as combinações possíveis.
- Também pensei num modelo de cidade de que deduzo todas as outras - respondeu Marco - É uma cidade feita só de excepções, impedimentos, contradições, incongruências, contrassensos. Se uma cidade assim é o que há de mais improvável, diminuindo o número dos elementos anormais aumentam as probabilidades de existir realmente a cidade. Portanto basta que eu subtraia excepções ao meu modelo, e proceda com que ordem proceder chegarei a encontrar-me perante uma das cidades que existem, embora sempre como excepção. Mas não posso fazer avançar a minha operação para além de um certo limite: obteria cidades demasiado verosímeis para serem verdadeiras.

Italo Calvino, As Cidades Invisíveis.

quarta-feira, dezembro 13, 2006

nossa senhora, minha irmã

quanto sabes, tanto vales

Ultimamente ando a colar com um livro de provérbios portugueses que roubei ao meu pai.
Este tipo de sabedoria popular, às vezes é surpreendente e emocionante, outras apenas irritante.

Ontem estava eu na rua do Almada a comprar umas lâmpadas e entra uma mulher a cheirar a peixe fresco e botinhas de borracha. Ficou lá uns 10 minutos a querer convencer toda a gente que as sapateiras dela eram melhores que as outras, que para nós eram só 7 euros, que para a próxima semana trazia um polbo marabilha ispanhole.
"Anda lá filha, compra-me os bichinhos".
Depois atendeu o telemovél e recebeu uma encomenda para o restaurante Garreti. Desconfio que este último I não faz parte do nome do restaurante. E lá foram as (agora alegres) botinhas de borracha carregando as (agora tristes) sapateiras.
Amo cada cantinho de cada loja de ferragens na Rua do Almada.

Mas agora é tempo de sabedoria...

Provérbios surpreendentes:
-Banana madura não se sustenta no cacho.
- Se queres ver teu marido morto, dá-lhe pepino em Agosto.
-Não te assustes que a pistola não tem fecho.
-Com arte e engano se vive metade do ano, com engano e arte a outra parte.
-Nem mesmo Deus pode por inteiros os ovos mexidos.
-É melhor ser porqueiro que porco.
- Depois do coito todo o animal fica triste, excepto a mulher e o galo.
-Ai Manel Manel, não tens abelhas e vendes mel.
-Se vês que o vinho te prejudica o trabalho, deixa de trabalhar.

Provérbios irritantes para o próximo post.
Espero pelos vossos também.


domingo, dezembro 10, 2006

sexta-feira, dezembro 08, 2006

hoje

o inverno, esqueci-me dele.
agora apareceu feito gente. feito gente que nos manda usar camisolas, ligar aquecedores.
o inverno tem algo de passado, as pessoas vivem no verão para se lembrarem no inverno.
copianço mal feito na copipronto que nos aquece quando ouvimos a fotocopiadora lá ao fundo.
lá ao fundo. tudo parece longe com esta chuva, com este vento, com estas nuvens.
vai chover amanha, esta muito vento, as nuvens anunciam. que tempo é este?
o monopólio esquecido nos arrumos, o baralho que lhe faltam algumas cartas.
falta sempre alguma coisa no inverno.

sábado, dezembro 02, 2006

velhas conexoes nunca se perdem

talvez maior parte de vocês já tenha visto os quadros ao vivo (vivos).
talvez maior parte de vocês já não venha aqui.
haja fidelidade.

o natal aproxima-se com o ano novo (quão novo?).
tenho vontade de emigrar outra vez.
talvez escolha um novo destino para passar os primeiros meses de 2007, um sítio quente com janeiros diferentes dos nossos.
ha também a possibilidade de ir para uma residência artística em berlim, mas não consigo perceber o critério de selecção. é mandar o application form e esperar.
esperar.

tempo.

ano novo.
natal velho.
os outros à espera que eu não respeite o tempo, que eu goste de natais velhos.
que eu sinta o novo ano como uma nova adulta ou como uma velha adolescente.
até janeiro.

alguns elephantes





domingo, julho 16, 2006

my dear berlin

Penso que Berlim é a cidade onde eu gostaria de morar e trabalhar. Confesso que em 15 dias, podia ter visto muito mais museus, mais arquitectura, mais monumentos. Podia ter estudado mais a história da cidade, conhecer outros tijolos de um antigo muros que se vai projectando ao longo de muitos percursos. Decidi viver la por pouco tempo, entregar-me as esplanadas, aos parques, as bicicletes, ao metro que nao vem, as galerias que vao aparecendo. E são tantas.
A mim, pareceu-me que Berlim muda todos os dias, uma cidade em construção sem buracos nem gruas.
Depois há as palavras e as cores, e a cidade transforma-se em texto pelos inúmeros grafittis, stencils e cartazes presentes em tantas paredes.
Banda desenhada, papel de rascunho, bloco de notas. Paredes.
As feiras, os mercados, os produtos biológicos, os kebabs turcos, a comida asiática, os restaurantes de luxo.
Os supermecados baratos.
Dormi em quatro apartamentos diferentes: grandes e luminosos todos eles. Janelas velhas, patios interiores, tudo muito bem arranjado.
E pessoas bonitas, que ja nao sei se as há ou se sou que as procuro.
Uma noite fui a um concerto. O palco era a continuacao da plateia, nao havia diferenca de alturas. Ambos estavam estabelecidos no fundo de uma piscina vazia, com uma iluminacao a rigor que fazia as paredes azuis de mosaico transpirarem intimidade. Queria estar ali, espaco semi-claro com escadas de ferro antigas. Nao havia prancha. O tecto era feito de arcos primos dos renascentistas. Harmonia entre publico e artista, entre chao e tecto. Um barzinho improvisado para que nao faltasse agua nem bebidas alcoolicas. Encantadoramente irónico.
A musica parecia boa.

Depois encontrei amigos que conheci na India. Passeei com eles pelas ruas de Berlim cheias de restaurantes indianos para todos nós. Os deuses também são importados e asseguram uma boa decoração.

O futebol foi um pormenor e também ele tem lugar nas paredes em grandes murais com a equipe brasileira pintada de verde e amarelo. Por baixo está escrito o slogan : " Joga bonito".

Alguém me traduza para alemão.

num parque em berlim com pessoas que gostam de futebol


num parque em berlim com uma rapariga que gosta de ser fotografada

segunda-feira, junho 12, 2006

Pang Gu e a criaçao (China)

"Terra e Céu eram ainda um e tudo era Caos. O universo era como um grande ovo negro que apenas continha Png Gu dentro de si. Passados dezoito mil anos, Pang Gu acordou do seu sono divino. Sentindo-se a sufocar, pegou num machado e quebrou o ovo. A parte leve e lisa do ovo ergueu-se e deu forma aos céus, a parte turva e pesada ficou em baixo e fez-se terra. Pang Gu ficou no meio, tocando o céu com a cabeça e a terra com os pés. Céu e terra expandiam-se rapidamente e Pang Gu acompanhava-os e crescia com eles. Passados outros dezoito mil anos, o céu estava mais alto, a terra mais espessa e Pang Gu, medindo nove milhões de li, garantia que as metades do ovo não voltariam a tocar-se.
Quando Pang Gu morreu, nasceram da sua respiração o vento e as nuvens. A sua voz fez-se relâmpago, os olhos tornaram-se sol e lua, o seu corpo deu lugar a cinco grandes montanhas e é do seu sangue que hoje correm as águas. Dos seus pêlos vêm as estrelas, dos seus músculos o solo fértil e do seu suor as chuvas. O homem nasceu dos seus piolhos e das suas pulgas."

sábado, junho 10, 2006

segunda-feira, junho 05, 2006


s/titulo escrita sobre fundo negro negro 1x5cm 2006

ja que nao consigo escrever, vou publicando umas fotos.
alguem me faz o favor de mudar este template para algo mais claro? ernesto, tu é o manager do blog...

quarta-feira, maio 17, 2006

pergunta

sera que faz sentido continuar a escrever?
continuo a projectar-me no passado ou rendo-me ao presente?

No interior da bahia, no interior da pousada

Depois veio a dona angelita e a sua pousada cheia de ninguém. Eu e ela vivemos juntas durante uns dias, à espera dos clientes que iam sempre chegar sempre no dia a seguir. A dona Angelita tinha 11 filhos e tratava-os de forma carinhosa mas distante. Muito calo. A mim, fazia-me todos os dias o pequeno almoco. Ouvia-a a chegar à pousada por volta das 6 e meia, cheirava a banana frita e a paozinhos de queijo. Era a unica cliente, mas isso dava-lhe um certo prazer. Eu, sozinha, num quarto para quarto pessoas e num hotel para 30. Eu. A Dona Angelita morava uns metros abaixo na porta numero 80, mas era como se vivesse na pousada. Era ela que tinha as chaves de tudo e os seus inumeros netos vinham comer a cozinha os restos do meu pequeno almoco. O dono nunca aparecia. Nao devia querer cumprimentar os clientes que ainda nao chegaram.
No principio falava com um sotaque reles brasileiro para que nos entendessemos, mas depois rendi-me ao meu sotaque tripeiro. Ela assumiu, orgulhosa, que "foi pegando o jêto".
Convenceu-me a comprar umas imitacoes rascas de havainas (que me fizeram bolhas nos pés) na mercearia do neto, e a arranjar as unhas no salao da filha que era pedicure semi-professional. Brasileiro é mesmo assim, sempre atento às possiveis necessidades dos turistas, na procura talvez inevitável de juntar mais alguns reais.
Na despedida deu-me um bilhetinho com o número da vizinha Maria. "Mi liga dipois, pa eu saber di voce".
A Dona Angelita não tinha telefone em casa.
Eu guardo o bilhete mas ainda nao lhe telefonei.

segunda-feira, maio 08, 2006

os ricos de baixo e os pobres de cima

A hierarquia carioca nao segue as regras convencionais. Na base da piramide estao os mais ricos, os empresarios, politicos, actores de novelas. Pelas encostas vao surgindo infinitos formigueiros quase ate ao topo, favelas feitas de gente e de casas construidas pelas pessoas de cima. As pessoas de baixo tem medo das de cima, mas prestam-se servicos mutuamente. Quem desce pode voltar a subir, quem sobe pode nao voltar a descer.
A magia não desaparece com a inseguranca que as vezes se sente.
Construcçao e natureza parecem viver um casamento feliz. Os morros exponenciam a beleza da arquitectura e a arquitectura denuncia a verdade dos morros.

A noite do rio é um circo sem palhacos nem palco. Todos participam.
O corpo é arma e alvo. Tudo para todos os gostos. Mulheres a cozinhar, artistas a cantar, gente a dancar. Efemeridade.
E corpo outra vez. Sempre. Beijos que surgem entre goles de cerveja partilhados ou passos de forro. O clima. Amanha nao existe. Subiremos la pra cima outra vez.

No ultimo dia vim ao Pao de Acucar, de onde agora escrevo. Nas placas de sinalizacao esta tb escrita - para quem nao sabe portugues - a versao inglesa: "Sugar loaf".
Ha poucos brasileiros.
Aqui é a unica piramide onde ricos nao tem medo de subir, e ainda se paga para entrar.
Reconheco com nostalgia o sotaque ingles da astraulia, o doce espanhol argentino.
Penso: "Se calhar ja passei a porta de vossa casa".
Ouvem-se camaras, muitas. Devem ter sido carregadas com muito cuidado ate aqui, taxis a porta do hotel a espera deles e das camaras.
Aparecem alguns portugueses.
Prezados turistas de imaculadas meias brancas: silencio por favor, chegou a vez de ouvir falar a minha lingua.

terça-feira, maio 02, 2006

bem vindo ao aeroporto sa carneiro, ate sempre memoria

Ja cheguei. Mas tenho ainda dois textos escritos que nao tive tempo de passar. Sobre o Rio, sobre o Brasil.
Depois de se sonhar acorda-se sempre na mesma cama. Os lencois sao os mesmos, o Porto tem manias e personalidade de velho. Não é uma desilusao.
Tirar um penso colado a pele que tem que sair. Chegar é ter que arrancá-lo. Doi, mas depois ate pode ser melhor ou pelo menos mais limpo. Vou continuar a escrever. A memoria nao me deixa parar. A vontade de viver tambem nao. Ate ja.

domingo, abril 16, 2006

o noroeste argentino

Depois veio outra vez o carro e as estradas que trazem pensamentos e sensacoes. A amiga que atravessou o atlantico à minha esquerda, o mundo à nossa volta. Tres dias dentro do carro a assistir a um filme mudo sem intervalos. Sem pipocas. Mas com alguma banda sonora, depois de andar aos socos no radio do fiat uno alugado que insistia em nao dar som. Devia ter medo de tanta beleza.
Depois há rochas que mudam de cor e forma e outras coisas que nao vale a pena falar. O vento vem e da-lhes formas leves e sofisticadas. Já há muito que deixaram de ser rochas. Agora sao o que cada um ve nelas, nuvens duras pousadas na terra dos homens. Narizes deformados, bocas cheias de fome, cabelos em pé, vestidos de noiva, aquelas rochas pertencem a imaginario de cada um. Autoritarias e absorventes. A fotografia nem sempre funciona.

Depois, encontra-se um rapaz a pedir boleia. Está com o pai e os dois carregam tendas. Nós paramos e eles dizem nao ser normal duas raparigas acreditarem em dois homens com o dedo para cima na berma de uma estrada. Agradecem a boa vontade. O pai de olhos azuis muito grandes, barba grande e boné. O filho de barba escura e olhos pequenos castanhos. O pai que fala, o filho que está calado. Eu que respondo, a dalila que está calada. Eles tinham uma casa ao lado do rio e das rochas que já não são rochas. Construiram-na sem terem pedido a ninguém, assim, feita de areia e de tempo. Eu perguntei ao homem velho dos olhos grandes se o facto de ele ter casa lá fazia com que se habituasse à beleza e já não abrisse a boca de cada vez que saísse de casa. Ele respondeu que não, que viver ali era uma "experiência espacial". Mas passar também o era.
Depois soube que éramos de Portugal e falou do Eusebio, da Amalia, do Salazar e da "revolucion".
Eu ouvia-o sem ouvir, a saborear aquela voz velha que falava dos nossos simbolos nacionais com acento argentino. Acho que aquele dialogo, por ter nada e tudo de especial, não me vai sair da memória. Acredito que deixei um bocadinho de mim naquele circuito de tres dias mas ja nao o quero ir buscar.

sábado, abril 08, 2006

Desculpa. Nao entendi, quem é que se depila?


a/o ? a nativa que pede dedo?

o cao ou a senhora? a evita peron?
a personagem cinematográfica?

a jovem de 80? a chica da montra?

as artistas? a companheira do dieguito?

o possivel senhor?

terça-feira, abril 04, 2006

capital de pernas depiladas

Se Buenos Aires fosse alguém era ma mulher. Perigosa e atraente. A cidade vive do seu glamour e deixa-nos levar pelas malhas, nem sempre consequentes, da beleza. Assume-se nos cafes à moda antiga, nas livrarias de escada em caracol, nas padarias que fazem fome, no tango da rua, nas feiras de antiguidades. A cidade parece barata mas não o é: as mulheres são de valor inconstante e podem sair caras a quem se apaixona por elas. Vai-se gastando um bocadinho aqui, depois é só aquele gelado ali, o cd que está uma pechincha ou o hotel que é só mais um euro mas que está no centro. A cidade é exigentemente feminina e reclama atencao. O porteno (habitante de buenos aires) é orgulhoso e visualmente elaborado. Sao muito politicamente activos e ha quem diga que as manifestações se tornaram em desporto nacional. Gostam de viver bem, de comer bem, de vestir bem. O brasileiro diz sobre o argentino : " eles comem merda e arrotam caviar". Há um circo de ilusões que vive de trapezistas equilbrados numa corda e seguros ao tecto por fios de nylon invisiveis. Assim, se alguem cair, os outros não vêm.

Mas ha qualquer coisa que me aborrece nas cidades colonizadas por espanhóis: as infinitas ruas e avenidas que chegam ao numero 20000, a malha urbana toda feita a partir de perpendiculares e paralelas. Pessoalmente, na falta de alguma organicidade sinto-me perdida e a noção de esquerda ou dirita confunde-se constantemente. Quando tudo é tão igual a orientação torna-se mais complicada. E não há a "ruazinha que sobe" ou o bequinhos sem saida. Longas avenidas estabelecidas num plano sem fi, democracia de alturas, ausência de surpresas. Bairros com vida independente onde elite e "povo" se vão distinguindo e hierarquizando.

Uma grande parte de Buenos Aires nao a vi: a mulher sabe sempre esconder o que de menos bonito tem.


quinta-feira, março 23, 2006

Nao me deixem que eu sou fiel

Amores, nao me esqueco de voces e prometo escrever testamento em breve. As vezes torna-se dificil compilar ideias ou pensamentos com desiquilibrios tao intensos quantos os da Argentina.
Mas sem duvida, é o pais mais bonito que visitei ate agora.
Uma experiencia intemporal no espaco desabitado. A diversidade da Natureza.
Uma experiencia latina, europeia, conhecida mas intensa nas cidades.
Uma experiencia tentadoramente perturbadora nas pequenas aldeias feitas de vazios e de falhas que se mostram nas casas de areia sem agua nem luz.
Ate ja.
Pelos vistos, vou ter que chegar em Maio.
Mas em Junho vou me por a boleia para a Alemanha para ter oputra pequena experiencia mundial dentro do mesmo país.
Pai, queres vir comigo?
Um reporter e uma fotografa a apoiar a seleccao e a documentar como vivem os nossos imigrantes em terras do norte...

segunda-feira, março 13, 2006

sábado, março 11, 2006

Nao nos deixes, minha Nossa Senhora.

So vos digo que buenos aires se chama assim por causa da santa padroeira dos primeiros navegadores portugueses que chegaram a tao aclamada terra. Somos sempre os primeiros a chegar e os ultimos a ganhar. Quando se encontra um pedaco de terra, nao se faz grande coisa.

Mas os bons ares continuam. Pelo menos por aqui.

sexta-feira, março 03, 2006

Desafio

" De agora em diante serei eu a descrever as cidades - disse o Kan. - Tu nas tuas viagens verificarás se existem.
Mas as cidades visitadas por Marco Polo eram sempre diferentes das pensadas pelo imperador.
- Contudo eu tinha construído na minha mente um modelo de cidade que deveria deduzir-se todos os modelos de cidades possíveis - disse Kublai. - Contém tudo o que corresponde à norma. Como as cidades que existem se afastam em grau diverso da norma, basta-me prever as excepcoes à norma e calcular as combinacoes mais prováveis.
- Também eu pensei num modelo de cidade de que deduzo todas as outras - respondeu Marco. - É uma cidade feita só de excepcoes, impedimentos, contradicoes, incongruencias, contrassensos. Se uma cidade assim é o que há de mais improvável, diminuindo o numero de elementos anormais aumentam as probabilidades de existir realmente a cidade. Portanto basta que eu subtraia excepcoes ao meu modelo, e proceda com que ordem proceder chegarei a encontrar-me perante uma das cidades que existem, embora sempre com excepcao. Mas nao posso fazer avancar a minha operacao para além de um certo limite: obteria cidades demasiado verosímeis para serem verdadeiras."

in "As cidades invisíveis"
Italo Calvino.


Esperando que se facam cidades nos vossos comentários, Maria.

quarta-feira, março 01, 2006

Adivinha o pais e ganha o premio ;)

"Buenas tardes, senorita. Que ojos mas lindos que tien usted."
E pronto, cheguei a Espanha mas pelo Pacifico. É a latinada. Eles andam nas ruas, eles andam nas pracas, eles andam nas praias, eles comem carne e bebem cerveja. Eles juntam-se. Eles sao parecidos connosco: sujam as casas de banho e deitam picas de cigarro ao chao. Eles falam alto, deitam os foguetes e fazem a festa. Eles mandam bocas tal e qual as de qualquer trolha com imaginacao da rua Santa Catarina poderia mandar. Eles sao consumistas e capitalistas. Eles tem uma natureza incrivel que eu nao vou ter tempo para ver. Eles sao um pais sem largura mas de norte a sul é qualquer coisa como da Alemanha a Nigeria. Eles tem uma cultura "pre-colombina" que é exemplo de sabedoria, imaginacao e rigor. Eles foram colonizados e nao colonizaram. Muitos morreram, mas isso é aquela velha historia que todos sabemos. Eles tiveram Pinochet no poder. Eles tem velhos nas pracas de bone na cabeca e a jogar damas. Eles tem pessoas a vender oculos sol e perfumes de "marca" no chao das ruas sobre um plastico azul. E mitrolas a fazer um espectaculo digno de qualquer estudo de marketing, a vender canetas dos chineses nos autocarros. Estou outra vez sozinha, mas bem acompanhada. Pelo menos, alegria nao me falta.

domingo, fevereiro 19, 2006

Mary a redimir-se

Eu sei que nem sempre ponho as virgulas qd tem que ser e ha sempre alguns erros nos textos...mas nao tenho tempo nem dinheiro para poder corrigi-los...peco desculpa ao Pessoa, ao Camoes e ao resto das pessoas que gostam de portugues e lem o blog ;)

A Heidi e o Marco

Feliz nas montanhas e sempre com o amguinho atras, este tem sido os meus dias.

A ilha do sul da Nova Zelandia e' dificil de descrever porque aqui tudo e' bonito com excepcao das cidades. Estas invadem os campos, o mar ou as montanhas como pedacos de lixo caidos do nada de uma forma organizada. A arquitectura e' quase inexistente: as casas consistem em 2 ou 3 modelos pre-fabricados que a aki de ca tem para oferecer, e as cidadezecas sao tao pequenas que nao e' necessario uma organizacao urbanistica por ai alem. Basicamente, uma rua comprida com um supermercado, correios, restaurante de fast-food e casas de banho publicas onde podemos ter quase todo o tipo de regalias e limpezas de graca. So lhes falta chuveiro, e assim tomar banho torna-se num acto pouco frequente.

O pais tem 4 milhoes de pessoas e 70 milhoes de ovelhas que o ser humano anda a tentar reduzir para metade. Na ilha do sul apenas 800 mil pessoas, que se espalham entre cidades mais ou menos desenvolvidas e quintas no meio do nada. As poucas pessoas que vamos conhecendo sao aquelas a quem damos boleia. Outro dia foi a vez de um homem na casa dos 40, bone, bom porte mas ligeiramente encurvado. Nao tirou os oculos de sol durante toda a viagem e veio calado quase todo o tempo. De vez em quando, faziamos-lhe perguntas sobre a regiao para melhor podermos planear a viagem e ele respondia rapida e eficazmente. Nao eram raras as vezes que nao percebia o nosso acento latino. Tinha uma profissao deveras curiosa: todos os dias fazia pessoas voarem. Trabalha para uma companhia de skydiving e e' ele que se tem que atirar com os aventureiros clientes (e ricos), e depois sacar do paraquedas quando for a altura certa. Os primeiros 50 segundos sao em queda livre, um dia tenho que experimentar. Faz isto ha alguns anos e ja deve terouvido todo o tipo de gritos que o ser humano pode expulsar. No final, convidou-nos para aparecer em casa dele junto ao rio no dia seguinte, para tomarmos um banho e dormirmos numa cama. O Antonio disse-lhe que gostava de pescar e ele tambem sugeriu a tal caca aos peixinhos como programa da matine.
Quando chegamos cheirava a carne. Havia um fogao de sala e um fogao de cozinha que funcionava tambem ele a lenha. A casa tinha sido comprada por 6 amigos e tudo estava a ser lentamente arranjado: hoje e' a vez das cortinas, amanha a do chuveiro. E assim passamos horas e horas na sala com o calor da lenha que fomos buscar a praia: eu sentada num sofa largo so para mim, o antonio noutro igual, e ele numa especie de poltrona mais afastado do fogo e de nos. Ele a beber cerveja de 700 ml da marca que mais gostava, e nos a bebermos umas mais pequenas que supostamente tinhamos trazido para lhe oferecer. Tinha duas filhas, uma de 13 e outrada minha idade. Nao era um homem interessante, nem tao pouco tinha conversa. Nao precisava de falar e o silencio assim nao se tornara incomodo. Respondia sempre as perguntas tal como antes o tinha feito no carro. Nao parecia feliz nem infeliz. Nao se ria nem se queixava. Estava ai sentado, a ouvir-nos falar e a deixar que as horas passassem ao ritmo viciante do fogo e do cheiro do carne que tinha estado a elaborar para nos com carinho, ou simplesmente com naturalidade. Era uma carne tenrinha das vacas do pasto ao lado, com ervilhas e batatas - verdadeiramente campones. Na manha seguinte tomou uma chavena de cha e nos comemos a tipica sandocha.

Agradecemos e fomos embora.

A vida continuou tal como era dantes. E os saltos tambem.

terça-feira, fevereiro 07, 2006

NOVA (Ze)LAND(ia)

Isto aqui e' bonito e pronto. Nao consigo descrever as cores do ceu, nem dos mares, nem das arvores. E' imenso e brutal. A capital, Wellingnton, e' como todas as cidades europeias. Os gajos comem muita fast food e cozinha chinesa. Ha chinos em todo o lado, cada vez admiro aquele povo. Sabem como se fazer a vida.
Continuam a aparecer pessoas vindas do ceu na minha viagem:
Estava eu a procura de hostel ha mais de uma hora porque tudo estava cheio, e quando viro as costas desapontada a mais um recepcionista, ouco uma voz a dizer - "hey, i can see you didn't get room...we have two rooms, we can give you one..." Pois e', o casal resolveu dormir apertado para dar tecto a uma tuga morena e desesperada que andava pra'li cheia de mochilas e tachos. Nao tive que pagar um centimo, nem a eles nem ao hostel. Foi um bocado chato sentir-me ilegal, mas bem melhor do que pagar aqueles donos ricos. Duas noites a pala deles, e depois ainda fizeram questao de me oferecer um kebab e uma cerveja. Fantastico.
E por falar em ilegalidades, tive uma situacao deveras caricata no aeroporto na Nova Zelandia. Depois de pegar na minha mochila e pronta para sair do aeroporto, tive que passar por aqueles raios x e por aquela cambada de poilicias que nos apalpam e olham para nos como se fossemos possiveis terroristas. Pois bem, eu fui uma das seleccionadas a quem eles tinham que checkar toda a bagagem e tudo mais que eu trouxesse comigo. Olharam para mim, perguntaram se estava a viajar sozinha e puseram-me logo para o lado. O policia era um idiota, daqueles simpaticos por cinismo. Perguntou-me milhares de coisas relacionadas com a minha vida, onde ia, como ia, donde vinha, o que pintava etc. Depois passou um papel redondo na minha carteira para ver se encontrava residuos de droga e va-se la saber como, aquela maquineta apitou positivo. O palerma dizia que era cocaina que para ali andava ou ja tinha andado na pobre carteira (uma pura e inocente carteira castanha que eu tenho com um elefante...quem se lembrar dela ganha um premio!). Eu fiquei a olhar para ele com uma cara ainda mais idiota que a dele...disse: "what? it's impossible." Mas depois pensei que era melhor ficar calada, porque eles ja devem ter ouvido essa mesma frase de muitos culpados...Sentei-me por uma hora e tive que assistir dramaticamente ao espectaculo do policia cuscuvilhar toda a minha mochila enquanto me ria com a forma como pegava na roupa interior suja e nos pensos diarios. Acho que a certa altura ele pos mesmo em consideracao se eu era dealer ou nao. Depois de passar o tal papelinho magico em todo o sitios possiveis e dar negativo em todos eles, o gajo la se convenceu. Eu disse que ele tinha que passar outra vez na tal carteira porque eu queria ver o resultado outra vez. O homem passou a volta do couro sem tocar nos cartoes e deu negativo. Disse-me para ter cuidado com os cartoes de credito que toda a gente mexe neles e que muitos deles vem com cocaina. Mesmo assim, antes de me deixar ir embora teve que ir falar com o boss para os dois pensarem profundamente se eu podia ir em paz ou nao. No fim disse : "Ok Maria, you can go, we are happy with you". Apetecia-me bater-lhe, mas apenas lhe disse muito educadamente que nao gostei da forma como ele, quando se dirigia a mim, ja me estava a acusar indirectamente. Virei as costas e fui procurar um autocarro barato ate ao centro.
Nao sabia para onde estava a ir, e a certa altura resolvi perguntar a motorista onde ficava uma rua que eu tinha anotado para procurar hostel. Ficou toda a chateda e perguntou-me se eu achava que devia interrompe-la enquanto estava a guiar. A mulher nao deve ter percebido que estava parada no sinal vermelho e exactamente por isso e' que lhe perguntei naquela altura. Lembrei-me logo dos fantasticos autocarros portugueses onde de la de tras se pode gritar e ofender quem quer que seja : "Oh senhor motorista, olhe a porta de tras...boce e' besgo ou mouco?..."

Pelos vistos estou entregue a um dos paises que muita gente considera ser o mais bonito do mundo...A ver vamos.. o carro ja esta alugado e comprei um fogaozinho minusculo para me consolar com comida enlatada.
Qualquer dia nao sei onde vai caber tanto sentimento.

quarta-feira, fevereiro 01, 2006

...



"Lembro-me dele (eu não tenho o direito de pronunciar este verbo sagrado, só um homem na terra teve direito a ele e esse homem já morreu) com uma obscura flor de maracujá na mão, vendo-a como ninguém a viu, embora a fitasse desde o crepúsculo do dia até ao da noite, toda uma vida inteira. Lembro-me dele, de cara taciturna de feições índias, e singularmente distante por trás do cigarro. Lembro-me (creio eu) das suas mãos afiladas de entrançador."...

(in Funes ou a memória, jorge Luis Borges)

(sei q para ti não necessitava referir a fonte..mas achei melhor. Ando a ler, e lembro-me tanto de ti...um abraço da mais pequena)



sexta-feira, janeiro 27, 2006

curto conhecimento desta curta historia deste longo pais

Sidney e' uma cidade onde e' dificil estar mal por tudo ser tao facil. Mas a verdade e' que estar mal e' diferente de estar bem, e estar bem e' muito diferente de ser feliz. O verdadeiro choque cultural. A magia da India era tao intensa, que no primeiro dia a percorrer a cidade tive a sensacao de caminhar no vazio, reparando nos buracos ou falhas que uma civilizacao ocidentalizada e com muito dinheiro nao pode deixar de ter. A evolucao traz tantas vantagens como desvantagens, mas isso e' como quase em tudo na vida. O pais e' extremamente novo e comecou ha pouco mais de 200 anos com os ingleses a mandarem os seus prisioneiros para a tal ilha imensa e deserta. Entre fugidos a lei, aborigenes (que ja estavam ca ha milhares de anos, mas que muitos deles morreram com doencas vinda da europa entre outras atrocidades) e milhares de chineses que mais tarde vieram para aqui fazer negocio, o povo australiano caracteriza-se pela sua extrema simpatia e relaxe. Sao cool, no verdadeiro sentido do termo. E' facil obter um sorriso ou uma conversa circunstancial com qualquer pessoa, ainda que superficial obviamente. Os dias em Sindey definiram-se pela procura da habituacao a esta nova cultura e por algumas caminhadas nas ruas e jardins limpos da cidade. A opera e' bonita mas precisa de obras. Os predios sao muitos, altos e tambem eles limpos. Tudo parece que foi construido ontem e ha um mundo exagerado de regras que ainda nao consigo respeitar. Em cada esquina ha um sinal a avisar que a rua esta a ser controlada por um sistema de video, mas nao me consigo sentir mais segura por saber tal coisa. No primeiro dia, fui logo expulsa de um bar por estar a fumar num sitio onde era proibido e de que ja tinha sido avisada. Vendem cerveja, passam musica e poem mesas de bilhar, mas nao deixam as pessoas fumar. Infelizmente tenho que compreender esta nova regulamentacao que, sem duvida, tem as suas causas e consequencias mais que positivas. Tudo e' carissimo e passo o dia a comer pao de forma que me deixa com gazes. Claro que compro daqueles castanhos com sementes para ver se disfarca, mas cheira-me que aquilo faz tao mal quanto os outros brancos. Os supermercardos insistem em criar uma especie de clima parecido ao da antarctida com o ar condicionado no maximo. Ja pensei em usar cachecol sempre que vou la buscar o tal pao castanho, mas depois penso que a t-shirt tipica decotada da mary e' suficiente. As vezes, ha tambem um pequeno computador onde confortavelmente o comprador preguicoso pode ver onde se situam os produtos que quer adquirir, poupando assim as suas delicadas pernas.
Mas o balanco e', sem duvida, positivo.
Estou outra vez acompanhada do Antonio, que me ocupa a cabeca com as conversas infindaveis que temos sobre os mais variados temas. E depois ha a natureza. Uma Natureza unica e brutal que me deixa com a boca aberta a cada 5 minutos. Rochas, arvores, cascatas, mar, rios e ceus de cores que ainda nao sei descrever por palavras ou adjectivos. Quilometros e quilometros de animais e vegetacao que nos fazem sentir impotentes e muito pequeninos...A mim vem muitas vezes a pergunta a cabeca: " Caramba, mas quem e' que pode criar isto?" - como sempre nao obtenho resposta. Depois tenho vontade de agradecer pelo privilegio de poder estar num sitio assim, mas tambem nao sei a quem.
Alugamos um carro o que nos da a oportunidade de ir para quase todos os sitios onde nos apetece. E como nao sei guiar e sinto-me um bocado mal por isso, fiz questao de ser um verdadeiro co-piloto. Vou vendo o mapa e dando orientacoes, umas mais acertadas que outras. Apercebi-me que gosto de analisar os mapas e acho que tenho alguma facilidade em faze-lo, como tambem deve ter qualquer amiga das belas (Ernesto, de ti ja nem falo). O carro e' o amigo e o abrigo, o verdadeiro suporte para a vida cigana que estamos a levar. Quando queremos descansar paramos naqueles sitios feiosos com casas de banho pre-fabricadas e mesas tipicas pro pic-nic. Dai toca a tirar a sandocha de pao de forma e o tintol (compramos 2 garrafoes de 5 litros para passar o tempo a noite com algum prazer acrescentado. Tia Miucha, nao se preocupe que depois o Antonio nao guia que eu nao deixo). Quando ja estamos cansados de apanhar vento na cara e de vinho foleiro vamos ressonar para dentro do veiculo. De 3 em 3 km ha este tipo de sitios cheios de facilidades, e as estradas sao infinitamente grandes e quase sempre muito seguras. Outra coisa nacional sao os barbecues, os australianos dao-lhe nas salsichas e na carne e ha grelhas publicas em qualquer parque que se preze. As praias estao repletas de familias com pranchas de bodyboard a tentarem apanhar ondas. Os verdadeiros surfers vao as 6 da manha para fugir a multidao e comecar bem o dia. Maior parte deles sao homens e dos 10 aos 100.
Ontem tivemos a falar com uma senhora de 50 anos (tipica bifa, gordinha, de bone na cabeca e sapatilhas muito brancas) que apareceu ao fim da tarde na praia com um detector de metais. Andava a procura de ouro ou de outras coisas valiosas que os outros pudessem perder ali. Entre aproveitar-se da desgraca alheia ou puro lazer de ouvir uma maquineta a fazer pi pi de vez em quando, nao sabia o que pensar da senhora. "It's my hobbie" - disse ela. E eu continuo assim, entregue a esta viagem e 'a oportunidade, quase sempre unica, de observar estes pequenos momentos da vida de outras pessoas e de outras partes do mundo.

sábado, janeiro 21, 2006

Evolução? Desculpa?

a evolução está em portugal!!!


evolucao?

as montanhas transformaram-se em predios e as mulheres de sari em prostitutas.

onde estou?

sexta-feira, janeiro 20, 2006

Recebi a foto…

cada vez mais, ao saber de ti, vejo-me necessitada e ligada a ícones incontornáveis…

tio lino

quarta-feira, janeiro 18, 2006

Um pedido...


(Sentada no Chapitô, making connections!)
K viagem maravilhosa essa tua... Não te esqueças de continuar a levar-me contigo!
Boa viagem para a Austrália, tenho a certeza de que vai continuar a ser fantástico.
Beijos deste lado do mundo, cheios de saudadades
Mi
(espero k tenhas recebido o meu e-mail...obrigada princesa Mary!)

sábado, janeiro 14, 2006

gokarna e quarto no acampamento cigano

Bem, ha duas maneiras de se viver Gokarna: ou se fica numa casita qualquer na vila de peregrinos, ou se vai viver para uma cabanita de bambu numa das praias paradisiacas das redondezas. Basicamente, as praias sao so para brancos, e os unicos indianos que se vem la sao os que trabalham para nos ou os que tentam fazer algum dinheiro connosco. Nao se pode dizer que a praia e' uma ma' opcao porque o ambiente parece ser porreiro e ali nao ha oportunidade para resort de luxo. Fogueirinha a noite, pessoal a tocar musica, e coisa e tal. Mas confesso que estou a viver um momento um pouco anti-social, e como estes sao os meus ultimos dias na India, resolvi ficar perto da comunidade local e peregrina, entregando-me mais uma vez a contemplacao desta cultura complexa e paradoxal. Quem ja esteve neste pais, entendera o que quero dizer com paradoxal: tudo o que se disser sobre a India, o contrario tambem esta' certo. Por isso, acreditem 50 por cento no que eu vou dizendo no blog. Acho que acaba por ser assim com qualquer generalizacao que tentemos fazer de qualquer povo, mas aqui de uma forma especial.
A vila esta repleta de indianos devotissimos que passam o dia a rezar e a queimar incenso com pinta na testa e com os mais diversos trajes. E' um regalo para os olhos. Depois ha a parte europeia: old old travellers com longos cabelos conzentos e barbas compridas da mesma cor. Acho que a media deve andar por volta dos 50/60 anos, e ainda nao percebi se eles estao aqui de passagem ou se resolveram estabelecer vida aqui. Mais uma vez vim parar 'a mais barata guest house de sempre (algo parecido com um acampamento cigano), e a minha vizinhanca e' um casal de 40 e muitos, que passam a vida a tocar flauta e guitarra indianas e a cozinhar a porta do quarto. Tem um filho loirinho que deve rondar os2 anos e que anda sempre nu. Este tipo de familia aqui e' um classico: pai barbudo, mae um pouco mais nova, filho nu loirinho. Ja vi uns tantos.
O meu quarto tem um colchao no chao e uma janela que da para a cozinha, mas que por misterio nao passa cheiro nenhum. As paredes nao sao pintadas - com tijolo e cimento a mostra - e o chao ainda nao percebi de que material e' feito. Para dizer a verdade, e' algo parecido a um pequeno estabulo, mas sem qualquer conotacao negativa, porque para alem de ser fresco, tem certos ares de aldeia portuguesa que me agradam. Tornei-o confortavel a minha maneira, o que se torna facil por ser pequeno. Ontem o puto nu entrou no meu quarto para brincar comigo e tentar ensinar-lhe a pintar com aguarelas. Parece-me que o pequeno ser estava a sentir falta de alguma actividade infantil, pois quando me quis ir embora la veio ele atras de mim a pedir mais e mais. Na verdae, foi um bocado dificil ensinar-lhe a pegar no pincel porque ele insistia que era maestro de musica, e entao punha o dedo tao na ponta (oposta ao pelo, obviamente) que se tornava impossivel fazer qualquer coisa. No fim, o resultado foi um monte de agua despejada para o papel de uma forma tao aleatoria que acabou por ter a sua graca.
De manha e 'a noite estou na vila, e 'a tarde vou dar um mergulho na praia. Os meus novos amigos sao os caes vadios e doentes, que nao sei porque razao, vem sempre ter comigo. Primeiro sentam-se de ladeiro com todo o respeito, depois com olhos de compaixao pedem por amor ou comida, e finalmente depois de me terem conquistado, querem sentar-se na minha toalha. Ontem andei a lutar com um, o caozinho nao largava a minha toalha, tive que me levantar e tudo. Era eu de pe a agarrar numa ponta e ele a trincar da outra. Tenho a impressao que toda a gente na praia se estava a rir de mim. Meia hora antes, tinha sido a vez de uma cadela manca cheia de cicatrizes a vir ter comigo. A relacao de amizade tornou-se tao intensa com a pobre cadela, que passado um bocado um gajo veio ter comigo, muito assutado, a dizer para eu nao a tocar porque ela devia ter raiva. Por acaso ainda nao lhe tinha tocado, o affair foi todo processado atraves de olhares que nao contagiam doencas.
Bem, amanha vou para Goa buscar o meu novo bilhete para a Australia e dia 18 sigo para Sidney. Uma coisa e' quase certa: aqui quero voltar, e nao vou cair outra vez na ambicao de comprar bilhetes de volt ao mundo se gosto de um pais e me apetece ficar nele.

quinta-feira, janeiro 12, 2006

Oferece-se amor autêntico...


Foi um sucesso, os cerveirençes (sem cedilha)sentiram o amor autêntico da Mary.
No dia seguinte o povo tava todo com o nariz vermelho e preto.

a importÂncia...

quarta-feira, janeiro 11, 2006

transformem quartos apertados nos melhores lugares do mundo!


as pessoas inteligentes têm espaço em qualquer lugar do mundo...
porque todos gostam de pessoas assim!

domingo, janeiro 08, 2006

E daqui nao consigo sair

Cheguei a Hampi no dia 28, acho. Nunca tenho a certeza do dia do mes ou da semana em que me encontro, e' um bom sinal, sem duvida. Depois de uns dias de praia, gente e festa em Goa, a minha cabeca ja estava a parar de uma certa maneira que nao me agrada. Nao tinha nada em que pensar porque tudo estava ali tao facil de adquirir..Cabanna em cima da pria, restaurante em cima da pria, amigos em cima da praia..."ai ai ai Maria, tens que sair daqui, para isso podes ir acampar para o Alentejo." Mas nao sabia muito bem para onde ir. A espanhola foi embora e eu estava sozinha sem guia a tentar decidir onde queria ir. E porque as palavras tem som e vida, olhei para um cartaz publicitario na rua com variados destinos e a palavra Hampi saltou de entre todas as outras e ficou na minha cabeca. Apanhei um sleeper bus para encontrar o sitio ou apenas a palavra, e quando acordei vi plantacoes de bananas com ruinas mituradas. Rochas e mais rochas com formas nunca monotonas a criarem pequenas colinas. E depois 'agua. Um rio, um lago, umas waterfalls. E pronto, rendi-me ao espaco e 'a historia desta vilazita. Depois de tantas cidades, ja era altura de um pouco de natureza. Tenho andado de biciclete, nadado, andado e ate subido montanhas para ver os fantasticos sunsets. Estou surpreendida como o sol nao se esquece de se por nem de se levantar um dia que seja. A melhor parte e' depois de o sol se por quando maior parte das pessoas vao embora satisfeitas com as suas maquinas...e a partir dai' esperar ate que seja noite. joana, todos os tipo de azul possiveis..
As ruinas estao espalhadas por 20 km around e (so) tem 500 anos. Pelos vistos, um grande imperio que foi destruido pelos muculmanos. Mas o sentido de tempo e' intenso, tempo que passou, tempo, tempo nas duras pedras das ruinas e tempo nas folhas novas dos bananeiros. Tempo nas pequenas aldeias que se vao encontrando com camas e redes ca fora, onde alguns homens descansam. Tempo no rio que nao para e onde esqueleticas mulheres passam o dia a lavar roupa. Isto nao e' uma declaracao feminista, mas e' mesmo assim. Tempo na agua quente que nao existe, tempo na merda de vaca que que usam para limpar as ruas, tempo nas maquinas de costura que estao fora das lojas para que os turistas possam ver como o alfaiate. Mas claro, a pequena vila vive do turismo e os precos nao sao tao baixos como em outros sitios onde ja estive. Mesmo assim, arranjei o quarto mais barato possivel. Um corredor com alguns quartos onde ha espaco para uma cama. Nao preciso de mais. De manha sento-me no corredor a beber cha com o meu vizinho que faz-me o pequeno almoco todos os dias a mesma hora...e a noite converso ou vejo um filme com o dono da guest house, na pequena loja de bicicletes que tambem pertence a mesma familia. A enorme familia vive tambem neste corredor em diferentes quartos para cada um dos irmaos e sua respectiva familia, o que me da' a oportunidade de observar o daylife indiano de uma forma mais real e directa. Cada vez que regresso ao meu quarto sinto que estou a voltar a casa. (Leni e Mae nao se assutem que nao prefiro esta do que a nossa da cantareira)
Estar sozinha e' gratificante, produtivo e maravilhoso.
Mas connections nunca deixo de fazer, obviamente...