terça-feira, abril 04, 2006

capital de pernas depiladas

Se Buenos Aires fosse alguém era ma mulher. Perigosa e atraente. A cidade vive do seu glamour e deixa-nos levar pelas malhas, nem sempre consequentes, da beleza. Assume-se nos cafes à moda antiga, nas livrarias de escada em caracol, nas padarias que fazem fome, no tango da rua, nas feiras de antiguidades. A cidade parece barata mas não o é: as mulheres são de valor inconstante e podem sair caras a quem se apaixona por elas. Vai-se gastando um bocadinho aqui, depois é só aquele gelado ali, o cd que está uma pechincha ou o hotel que é só mais um euro mas que está no centro. A cidade é exigentemente feminina e reclama atencao. O porteno (habitante de buenos aires) é orgulhoso e visualmente elaborado. Sao muito politicamente activos e ha quem diga que as manifestações se tornaram em desporto nacional. Gostam de viver bem, de comer bem, de vestir bem. O brasileiro diz sobre o argentino : " eles comem merda e arrotam caviar". Há um circo de ilusões que vive de trapezistas equilbrados numa corda e seguros ao tecto por fios de nylon invisiveis. Assim, se alguem cair, os outros não vêm.

Mas ha qualquer coisa que me aborrece nas cidades colonizadas por espanhóis: as infinitas ruas e avenidas que chegam ao numero 20000, a malha urbana toda feita a partir de perpendiculares e paralelas. Pessoalmente, na falta de alguma organicidade sinto-me perdida e a noção de esquerda ou dirita confunde-se constantemente. Quando tudo é tão igual a orientação torna-se mais complicada. E não há a "ruazinha que sobe" ou o bequinhos sem saida. Longas avenidas estabelecidas num plano sem fi, democracia de alturas, ausência de surpresas. Bairros com vida independente onde elite e "povo" se vão distinguindo e hierarquizando.

Uma grande parte de Buenos Aires nao a vi: a mulher sabe sempre esconder o que de menos bonito tem.


6 comentários:

Anónimo disse...

não conheço buenos aires, mas bastava este retrato para ficar desejoso de a conhecer...mesmo sabendo que é uma mulher que esconde os defeitos!!!

coentros disse...

Se te pudesses comparar a uma cidade qual serias?

coentros disse...

nao era uma cidade. talvez uma vilazinha cheia de sol junto ao mar, onde as pessoas nao fechassem as portas as chaves, e onde o convivio na praca pudesse substituir a televisao.

Anónimo disse...

oh mary! a clara telefonou-me e estivemos horas a falar sobre as nossas vidas...ela esta a viver um sonho e parecia mesmo feliz...gosto mesmo muito dela mas gosto mais de ti! quando é que voltas?
tenho recortado todas as imagens dos sitios onde tu vais e junto-as todas num livro, para quando acabar de fazer o album do joaozinho dedicar-me ao livro da madrinha! tenho tanta vontade de estar ai...e que tu estejas aqui!
o meu baby ja tem dois dentinhos em baixo e sempre que se ri eles aparecem...estou tão babada..mais do que ele!
ele já bate palminhas e tens de ver a minha figura aos gritinhos só porque ele consegue comer bolachas e bater palminhas!
hoje dei-lhe meia laranja e ele adorou! é como a madrinha adora laranjas, alias adora fruta..
´daqui a umas semanas vais estar cá e aí ja te podes orgulhar do teu afilhadinho, que é tão alegre!como tu, como tu! ...nem acredito que estas para chegar...nem vou acreditar, vou pensar que és uma miragem...adoro-te.

Anónimo disse...

ola outra vez...o meu pai esteve agora a ler a tua ultima mensagem e quer-te dizer qualquer coisa...

oh maria, a qualidade com que escreves e descreves o que sentes, o que vês, o que cheiras, leva-me a crer que poderás voltar a viajar e em breve sem teres que recorrer aos "subsidios" do BCP. Só tens que falar com alguém que conheças bem no mundo dos média e vender o teu travel book... Sou um apaixonado por este genero de escrita (ewan macgregor,miguel sousa tavares, cadilhe, etc) e considero (sem qualquer favor) aquilo que já li no teu blog, de maior qualidade. Havemos de falar sobre este assunto muito em breve... um beijão né!
p.s.- tou sabendo que vc está no Rio. Tenho aí um grande amigo carioca. se precisá algo, é só falá! Lhe posso dar seu contacto. Tou falando sério.

rui gama

Anónimo disse...

"Tudo para que Marco Polo pudesse explicar ou imaginar que explicava ou imaginarem que explicava ou conseguir finalmente explicar a si próprio que aquilo que ele procurava era sempre algo que estava diante de si, e mesmo que se tratasse do passado era um passado que mudava à medida que ele avançava na sua viagem, porque o passado do viajante muda de acordo com o itinerário realizado, digamos não o passado próximo a que cada dia que passa acrescenta um dia, mas o passado mais remoto. Chegando a qualquer nova cidade o viajante reencontra o seu passado que já não sabia que tinha: a estranheza do que já não somos ou já não possuímos espera-nos ao caminho nos lugares estranhos e não possuídos.
Marco entra numa cidade; vê alguém numa praça viver uma vida ou um instante que poderiam ser seus; no lugar daquele homem agora poderia estar ele se tivesse parado no tempo muito tempo antes, ou se muito tempo antes numa encruzilhada em vez de tomar uma estrada tivesse tomado a oposta e ao cabo de uma longa volta viesse encontrar-se no lugar daquele homem naquela praça. Agora, daquele seu passado verdadeiro ou hipotético ele está excluído; não pode parar; tem de prosseguir até outra cidade onde o espera outro seu passado, ou algo que talvez tivesse sido um seu possível futuro e agora é o presente de outro qualquer. Os futuros não realizados são apenas ramos do passado: ramos secos.
- Viajas para reviver o teu passado? - era agora a pergunta de Kan, que também podia ser formulada assim:
- Viajas para achar o teu futuro? "

...que linda e epopeica viagem a tua!
Viagem que para minha sorte já acompanho há mais de dez anos... todos os teus possíveis passados não seriam nem mais nem menos desejados do que esse teu presente; carregado de corajosos confrontamentos com aquilo que poderiam ter sido; dando cada vez mais segurança e certeza à rota escolhida...
Agora não é tempo de parar; uma viajante não pode parar... continua a boa viagem e eu só espero poder continuar a acompanha-la de perto.
Um beijo Grande; tenho saudades..