quarta-feira, março 25, 2009

roberto de limão

O Roberto, só naquele bocadinho estive lá, bebeu 4 ice-teas. Vi-o com estes olhos que a terra há-de comer, a abrir 4 latinhas daquelas. Era apenas um fim da tarde de terça-feira e não havia muito para fazer. Talvez por isso ele fosse achar que se intoxicar de açucar e teína seria a melhor opção. O Roberto abria as latas maquinalmente, indiferente ao som do metal quando se puxa aquela coisa e abre-se a lata. Pode-se dizer que esse som é excitante, sugestivo, inaugural. Faz-me lembrar a campainha de Pavlov. Acho que o que eu queria mesmo é que o nosso Roberto fosse que nem os cãezinhos, que ladrasse e se babasse ao ouvir o estalo metálico que lhe anunciava gratuitamente a satisfação de um desejo. Mas não. Talvez ele não sentisse desejo. O nosso amigo olhava em frente e prás, abria a lata, depois punha a cabeça assim ó pra trás, um golo desmedido, e voltava a pousar os olhos num livro que fingia ler.

(à noite, quando fui revistar os quartos e vi o Roberto a dormir, apeteceu-me abraçá-lo muito e dizer-lhe que a solidão não se cura com líquidos)

terça-feira, março 24, 2009

quarta-feira, março 18, 2009

gente com o vente

O homem da garagem não tinha qualquer sotaque. Sozinho na garagem grande, vestia uma camisa branca e mancava. Mancava sem se atrapalhar, não queria andar mais rápido do que podia. Tinha uma cara feita em gesso de onde não se desvendava facilmente a idade. As mãos eras grandes, como se dentro delas e dos ossos que nelas estão dentro, pudesse carregar mais segredos que nós.
- Um homem de camisa branca numa garagem - pensei.
Não foi preciso tirar bilhete nem registo.
- Menina, vá-se embora e não se preocupe.
Todos estes bilhetes que somos obrigados a tirar nos parques são demasiados pesados por representarem uma equação mal resolvida para quem gosta de viver: tempo = dinheiro.
O homem da garagem não tinha trocos. Vestia uma camisa branca e tinha o cantinho dele montado, na imensidão do espaço absurdo que é uma garagem.
Uma mesa vazia. Encostados à parede, uma lancheira quase fechada e um microondas com a hora errada.

segunda-feira, março 09, 2009

lanche

Ela falava, falava desmesurada, indefinidamente. Ela falava sem receptor. Há muito disto no mundo - pensei. Não percebo se é uma questão de arrumação mental, de desprezo pelas palavras, necessidade de integração, vontade de sair da concha. À noite, às vezes falo com o espelho.

(Olho em volta e bato com a cabeça na concha que está cada vez mais dura. É difícil abri-la, e partir não se aconselha. Às vezes revejo-me naquelas amêijoas que ficam no prato por estarem muito fechadas)

- Cuidado que essas não se podem comer!

Voltando à mulher. No início, até a ouvi. Havia um prato de salpicão na mesa. Depois comecei a emborcar o enchido de forma desumana. E à medida que a senhora se ia entusiasmando, eu ouvia-a cada vez menos, até as palavras se tornarem sons de dedos a baterem na concha. Truz truz. Não entram. Já estava lá dentro, num silêncio absoluto, e o sal do salpicão a roubar o sentido de todos aqueles ecos verbais, conservando-me viva e fresca na concha esquecida.

terça-feira, março 03, 2009

zézix

Caro Zézito, deixe-me que lhe diga: a palavra "simplex" é de mau gosto. Remete para marca de tachos ou tupperwares. Pior, ainda me faz lembrar aquele anúncio da clix que quer que compremos algo que é "à borlix".
Fonix Zé, respeita-nos. Promove o português correcto e poupa o povo a conhecer os teus pêlos da perna. Desde que te vi todo suado na televisão, a fazer uma maratona de domingo, nunca mais acreditei em ti.

ps: é verdade, outro dia ouvi um tio teu no telejornal a chamar-te de Zézito, e achei que todos te podíamos tratar assim.