terça-feira, maio 04, 2010

luz

Os regressos custam sempre. Olho para a planta que já parecia morta em cima da máquina de lavar a roupa e vejo uma folha. Passou todo o inverno nua, cúmplice silenciosa de noites geladas. Mas os caules, esses, mantiveram-se estoicamente de pé durante o inverno transmontano. Já não esperava que fosse renascer. Nunca soube nada sobre plantas, os olhos sempre debruçados em gestos e vícios humanos. Também não esperava voltar a este teclado para escrever sobre pequenos nadas que me foram parecendo sempre e cada vez mais indescritíveis. A florista vai-me aos poucos mostrando os dentes, sorrisos que o tempo generosamente me veio permitir receber. Para lá do Marão, não se confia em ninguém por dá cá aquela palha. No início, fala-se sempre sobre o tempo. A chuva que não pára, o sol que não veio para ficar, ai menina que hoje está um vento que não se pode. Depois findam-se as conversas com um “é a vida”, a melhor maneira de explicarmos ao outro que já não temos nada para dizer. Fico aterrada. Saio dos sítios com o rabo entre pernas, na promessa interior que no dia seguinte vou tentar explicar a quem me tratar assim que a vida não é, que só nós podemos ser, e que as plantas também falam e choram mas não se queixam do tempo.

1 comentário:

Andre Alves disse...

e é por isso que o marão me deveria roubar, para poderes vir a mim, levantar a cauda

as plantas sabem muito de assuntos adiados e de suspensão